Michel Temer é um homem com tempo. Quase oito meses depois de deixar a Presidência da República, ele está em dia com os principais lançamentos da plataforma Netflix: assistiu às minisséries Olhos que Condenam (“O Trump deveria pedir desculpas aos negros”, comenta) e Guerras Brasileiras (“Faltou incluir a Revolução Constitucionalista nos episódios”, nota), além de Os Últimos Czares.
Temer passa seus dias entre o escritório de advocacia e a casa, onde mora com a mulher Marcela e o filho Michelzinho, de 10 anos. Ocupa-se também da própria defesa – é réu em seis processos e chegou a ser preso em março e depois em maio, em um caso comandado pelo juiz Marcelo Bretas, responsável pelo braço carioca da Operação Lava Jato. E, por fim, dedica-se a seu novo projeto, um romance que qualifica como “uma ficção da minha biografia”.
“Romance é uma coisa assim, é um trabalho, você escreve, de repente você volta, rasga aquilo, escreve, reescreve”, explicou Temer em entrevista à BBC News Brasil em seu escritório em São Paulo, na última quinta-feira.
Na conversa, Temer repassa pontos de seu governo, que chama de “reformista”, e elogia o atual presidente Jair Bolsonaro (PSL) por dar “continuidade” a seu programa, o que inclui a aprovação da Reforma da Previdência e a proposta de uma reforma tributária.
“Eu me recordo, quando presidente da República, eu dizia: ‘olha, será bem sucedido o presidente que der sequência àquilo que estou fazendo’. Do jeito que as coisas vão indo, o governo vai bem, porque está dando sequência ao nosso governo”, disse.
O político do MDB comenta ainda seus dias atrás das grades, a prisão e o ostracismo dos antigos companheiros políticos, as conversas atribuídas ao ex-juiz federal Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol e a conversa que teve com o empresário Joesley Batista, cuja divulgação detonou a maior crise política de seu governo e quase o derrubou.
Com as mãos sobre uma cópia da Constituição, que fez questão de colocar em cima da mesa, ele se compara ao protagonista da série americana Designated Survivor, em que um secretário de governo é alçado à Presidência depois da morte do presidente e de todo o resto do gabinete.
“É a história de um sujeito que assume em um impasse. Eu assisti naquela época (do impeachment). Eu me via muito na figura dele, sabia? Porque ele assumiu meio acidentalmente, né (risos)?”, afirmou.