Com a taxa de juros em patamares mais elevados, um dos segmentos da economia que podem ser impactados é o de produção de bem duráveis, como veículos, eletrodomésticos e eletroeletrônicos, que demandam maior injeção de crédito.
Segundo especialistas consultados pela CNN, o cenário pode ser reforçado pelo enfraquecimento do consumo, já que com a Selic em 13,75% ao ano, maior nível desde 2016, consumidores têm mais dificuldade de crédito para a aquisição de bens duráveis, o que, por sua vez, também leva a indústria a reduzir sua produção.
“Os bens de capital, ou seja, máquinas, equipamentos direcionados a investimentos e também os bens de consumo duráveis, que dependem mais das condições de crédito, de financiamento, acabam sofrendo mais nesse ambiente de juros altos por mais tempo”, diz Rodolfo Margato, economista da XP.
Com a demanda menor e a produção reduzida, o resultado, em geral, é a desaceleração da atividade econômica.
“Vendendo menos, a produção também cai. Por isso tem se batido na tecla dos juros altos, pois cai o consumo, cai a produção e o Produto Interno Bruto (PIB) vem baixo. O juro é um remédio amargo. A pergunta hoje é se a dose desse remédio foi muito alta”, avalia Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos.
Outro ponto levantado pelos economistas que explicam uma menor busca pelos bens duráveis é o direcionamento da renda dos brasileiros.
Com a inadimplência atingindo um número cada vez maior de pessoas, os ganhos são direcionados para o pagamento de dívidas, como afirma Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos.
“Nesse momento, o que observamos na economia brasileira é um quadro na elevação da taxa de inadimplência. E os gastos das famílias mais pobres são concentrados em gastos de subsistência. Ou seja, isso acaba implicando diretamente na redução das compras de produtos eletrodomésticos e eletroeletrônicos, pois acaba sendo uma necessidade secundária em uma situação de aperto econômico”, disse.
Em cinco anos, o número de brasileiros inadimplentes passou de 59,3 milhões, em janeiro de 2018, para 70,1 milhões, em janeiro de 2023, um recorde na série histórica. Como mostrou um estudo inédito da Serasa Experian.
O valor das dívidas também cresceu. Em média, cada inadimplente deve R$ 4.612,30. Em janeiro de 2018, era R$ 3.926,40. Houve um crescimento de 19% no período.
O efeito de desaceleração da demanda também pode ser observado no mais recente indicador de vendas no varejo brasileiro.
As vendas no varejo caíram 0,7% em fevereiro deste ano na comparação com o mesmo período de 2022, já descontada a inflação, mostrou o Índice Cielo do Varejo Ampliado (ICVA) divulgado nesta terça-feira (14). Esta foi a primeira retração do setor após 15 meses de alta.
A Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) referente ao ano de 2022, elaborada pelo IBGE, aponta que a indústria fechou 2022 com queda acumulada de 0,7%. E, entre os segmentos do setor, o de bens de consumo duráveis foi o de maior retração, -3,3%.
A taxa de juros no início de 2022 era de 9,15% e encerrou o ano no patamar atual de 13,75%.
“Temos visto que a demanda das famílias e empresas por bens como automóveis, móveis, produtos eletrônicos vem arrefecendo desde a metade do ano passado. Os juros mais altos, em um quadro de endividamento acaba reduzindo as intenções de compra por esses bens. Naturalmente, em uma dinâmica de política monetária apertada, o consumo, os gastos das famílias e empresas com bens duráveis acabam contraindo mais”, conclui Margato.
CNN