À vista disso, em uma das visitas ao padre, demonstrei curiosidade pela diversidade de estilos das cerâmicas aplicadas em todo piso da igreja, além da construção do novo altar.
Referindo-me ao padre Kleber, fui recebido com muito carinho, além de profunda atenção às minhas inquietações, comportando-se explicativo e cuidadoso com as informações prestadas. Com olhar miúdo e mãos espalmadas, durante suas explicações demonstrava seus conhecimentos sobre a igreja matriz, comportamento inequívoco de sua fé e vocação.
Após um rápido café seguimos para o interior da catedral, que nos recebeu silenciosa e com brandura, me conduzindo ao campo inevitável da memória afetiva. Por alguns segundos, eu parecia escutar os hinos e ladainhas cantados pelos Marianos e as filhas de Maria e o som da matraca anunciando o momento da consagração. Tudo vinha ao mesmo tempo, até o repicar dos sinos no alto da torre central anunciava sua primeira chamada para a missa dominical. Olhando o altar reconstituído, lembrei-me da minha infância, quando aqui realizei a primeira Eucaristia, nos idos anos de 1970, que diante do velho altar posei para foto memorável, lembrança que ainda guardo no meu arquivo pessoal.
Entramos na igreja Matriz, hoje catedral, por uma das portas laterais, ainda as mesmas de muitos anos passados. Sentamo-nos por poucos minutos, enquanto o padre me explicava o significado dos altares laterais, abrigando diversos santos. Em meio a estas explicações me vem algumas lembranças de outras vezes que por aqui passei. Muito estive presente a esta casa santa na companhia de minha mãe. Olhando para o teto pela vidraça da memória eu via a grande e bonita imagem de Nossa Senhora da Luz de mãos estendidas, que parecia descer do céu em nossa proteção. A pintura da virgem mãe de Jesus sobre fundo azul celeste externou por muitos anos o talento e dedicação do artista Antônio Sobreira.
Saio do campo das memórias e retorno ao meu diálogo com o padre Kleber, que pacientemente retoma as explicações, chamando-me atenção sobre os diversos pisos implantados na igreja, desde os mosaicos mais antigos até as cerâmicas recentes de Brennand aplicadas no piso do altar central. Foram 17 intervenções até os dias atuais, fruto das ações dos párocos, nos mais diversos momentos históricos e religiosos de nossa igreja, conforme explicou.
Mesmo ouvindo sua narrativa, eu não tirava os olhos da pequena santa posta no nicho do altar. Foi daí que me veio à pergunta tão tradicional entre nós, se aquela imagem é a mesma trazida pelo colonizador português na segunda metade do século XVIII. Que diferença faria isso pra mim? Mas mesmo assim perguntei! Num olhar sereno que percorria toda a igreja, assim como nos momentos da homilia, sem contrapor a devoção por Nossa Senhora da Luz, ancorado nos estudos realizados pelo padre Reinaldo Miguel Calixto, em Raízes da Diocese de Guarabira: um ensaio histórico, respondia-me que a imagem de Nossa Senhora da luz, que hoje está posta no altar de nossa igreja, apresenta sinais idênticos a outras imagens como a de Nossa Senhora das Mercês de Cuité, a de Nossa Senhora da Guia de Patos, e a de Nossa Senhora do Carmo, da basílica do Carmo em Recife.
As expressões fisionômicas da imagem de Nossa Senhora da Luz – cabelo, face, manto, pingente do manto – são compatíveis com o estilo artístico de José Joaquim da Veiga Valle, um santeiro brasileiro remanescente de Aleijadinho, nascido em Goiás no início do sec. XIX, conforme escreveu padre Reinaldo.
Portanto, esta imagem que possuímos na igreja, não é a mesma trazida por José Rodrigues Gonçalves da Costa, o português vindo de Beiriz, fato este que não põe em dúvida e nem descredibiliza a fé católica do povo guarabirense.
Levar à luz estes saberes, parte do desejo de novas descobertas, com ânsia de fazer brotar em solo fértil novos pensamentos.
Guarabira, 02/03/2022
Percinaldo Toscano