Torcida Guarabirense! – Como diria o cronista esportivo Marcus Aurélio – este ano de 2024 é por demais emblemático para familiares, amigos e desportistas guarabirenses, que conheceram e conviveram de perto com um dos abnegados da história do futebol desta terra, outrora Vila de Independência, hoje Guarabira – insubstituível “Rainha do Brejo Paraibano” -. Guarabira de Osmar, de campos verdejantes, como diz o poeta Chico Pedrosa, uma cidade indomável, inacessível aos louvaminheiros e protetora dos mais singelos filhos. Terra mãe e avó de muitos outros protagonistas de sua história como João Salustiano, Benedito Targino, Zezinho de Gila, Chico do Baita, José Epaminondas, Antônio Sobreira, Maria Eulália e centenas de outros homens e mulheres. Assim como estas reconhecíveis e ilustres pessoas, nosso homenageado também muito amou Guarabira durante seus oitenta e cinco anos de idade. Foi seu chão inseparável.
Sua infância foi marcada pela prematura morte do seu pai em 1933, quando ficou órfão aos incompletos 9 anos de idade. Francisco Gomes da Costa, conhecido por XÍ, foi telegrafista da Great Western e primeiro motorista habilitado de Guarabira.
Contado por ele mesmo, narrava com ares de muita graça a história de que, “um dia, minha mãe percebeu que aquela tarde de céu escuro poderia resultar em chuva abundante e por precaução de mãe me prendeu em casa, evitando que eu saísse para tomar banho nas águas do Rio Guarabira,” nas proximidades da ponte de ferro, por onde passava o trem, e assim, estando impossibilitado, aos choros, contemplava pela janela a passagem de um cão, que livre e desimpedido passeava pela rua como se nada de anormal pudesse acontecer. Em soluços e lágrimas exclamava triste, “ Tá vendo aquele cachorro? A mãe dele nem se preocupa, ele anda sozinho para cima e para baixo, desejo nesta hora ser aquele cão, pois assim eu ficava livre para brincar, vejo que a mãe dele nem liga, mesmo que ele vá tomar banho de rio”. Na verdade, o Rio Guarabira em suas primeiras chuvas de inverno botava uma cabeça-d’água assustadora carregando tudo que encontrasse em suas margens.
Conquanto, teve uma vida infanto-juvenil marcada por momentos de felicidade, percorrendo ruas e campos para jogar futebol, despreocupado com o ocaso, acompanhava os irmãos Neco e Geraldo Pereira, Cira, Joca Florípes, João Patola, Tentem, Geraldo Galvão, Tavares e outros mais. De vida simples e infância ativa, soube construir amigos ao tempo em que dividia momentos de brincadeiras com algumas horas de estudo e trabalho, auxiliando sua mãe no trato com a mercearia, de onde surgia o sustento para a pequena família, composta por ele e dois irmãos. Foi um exímio contador de piadas e histórias engraçadas, além de criar outras. Algumas destas virtudes estão relatadas por Vicente Barbosa em seu livro “Memórias do futebol guarabirense”. Bem humorado, admirador da boa música, apaixonado pela Orquestra Tabajara de Severino Araújo, além de bom esposo e afetivo pai, foi extraordinário avô.
Conforme livro de registro de nascimento do cartório de Registro Civil da cidade, fora assentado que no dia 25 de outubro de 1924, abria os olhos ao mundo, na casa n° 53 da Rua do Sol, o filho caçula de Dona Severina Toscano de Britto. Um rebento iluminado!
Na busca pela independência financeira, montou uma garagem para locar bicicletas (1942), trabalhou com o cunhado Antônio Moura no bar do beco da igreja, em outra oportunidade associou-se ao irmão na instalação do bar Tudo Azul, produziu e vendeu canela em pó, ocupou função na Companhia de Água de Guarabira, aposentando-se como agente arrecadador de tributos pela prefeitura de Guarabira.
De menino travesso, carregou no doce cofre da memória, ao longo dos seus 85 anos, lembranças dos banhos no Rio Guarabira, utilizando-se da monumental ponte de ferro construída pela Great western, para fazer seu trampolim de sonhos astuciosos. Em seu imaginário o circo serviu como laboratório para contação de histórias e causos, narrando episódios circenses nas rodas de amigos. Gesticulava ao tempo em se reportava às histórias de palhaços. Em outros momentos, ficava profundamente compenetrado, como se estivesse ao confessionário numa narrativa real e cheia de encantos. Guarabira sempre estava acima dos entressonhos. Suas ruas, suas praças, ladeiras, os recantos da cidade, aqueles lugares mais longínquos da aldeia, tudo era motivo de suas contemplações. Na sua existência de nada reclamou. Caricaturava os tempos amargos em momentos descontraídos ao som de gostosas e sonoras gargalhadas. Viveu o tempo presente sem as vaidades cultivadas pela humanidade. Queridos e pacientes leitores, hoje nosso homenageado é Cleonaldo Toscano Gomes, o Nadinho Toscano, filho caçula de Dona Mocinha, este que nunca cedeu às intempéries da vida, que amou e viveu Guarabira.
Guarabira, 22 de agosto de 2024.
O Centenário – ( 1924/2024)
Percinaldo Toscano
Professor/cronista
Foto: Alexandre Moca