Torrada com abacate. Suco de kale. Smoothie de goji berry. Salada de quinoa.
Se os alimentos fossem celebridades, estes seriam apenas alguns que desfilaram pelo tapete vermelho nos últimos anos.
Mas por que apenas algumas frutas, verduras e legumes entram para a lista VIP da indústria alimentícia – de produtos altamente desejados com a capacidade de gerar lucro e influenciar os hábitos alimentares de bilhões de pessoas?
Por que o kale e o abacate tiveram uma ascensão meteórica em termos de popularidade e estão sob os holofotes, enquanto a cenoura ou o coitado do nabo seguem marginalizados?
A resposta é complicada e complexa.
Como o abacate conquistou o mundo
Vamos começar com o abacate – o queridinho da geração millennial. Hoje em dia, ele é encontrado com frequência nos cardápios, principalmente na versão “torrada com abacate”, a preços inflacionados.
A fruta se tornou tão conhecida e conquistou tantos fãs que é difícil encontrar uma empresa que não esteja tentando lucrar com a sua fama.
A companhia britânica Virgin Trains, por exemplo, começou uma campanha de marketing no ano passado chamada “#Avocard”. Depois que os cartões de trem esgotaram, a companhia decidiu oferecer desconto aos clientes com idade entre 26 e 30 anos que comparecessem à estação segurando um abacate.
Embora a reação dos millennials tenha sido polarizada – alguns acharam a promoção paternalista -, não há como negar que esta geração consome muito abacate. Basta observar a foto dos pratos que circulam pelas redes sociais.
Os seres humanos comem abacate há milhares de anos, mas os jovens na faixa dos 20 e 30 anos fizeram a demanda pela fruta disparar.
Um cirurgião plástico de Londres contou em 2017 que havia atendido tantos pacientes que se machucaram cortando a fruta, que sua equipe começou a chamar esse tipo de lesão de “mão de abacate”.
Por outro lado, há quem considere a torrada com abacate bastante cara em cidades como Londres – representando uma frivolidade e um exemplo da razão pela qual tantos millennials não conseguiriam sustentar sua moradia.
Há muitos fatores que influenciam a preferência de um alimento entre os consumidores: imagens pré-produzidas e suculentas do prato no Instagram, por exemplo, ou propagandas financiadas por organizações que apoiam certas indústrias alimentícias.
Histórias longas e elaboradas também exercem um fascínio em torno de certos alimentos, especialmente em países que estão distantes da origem do mesmo.
Jessica Loyer, pesquisadora em valores de alimentos da Universidade de Adelaide, no sul da Austrália, cita como exemplo o açaí e as sementes de chia, considerados “superalimentos”.
“Muitos desses alimentos podem ter histórico de consumo (em países em desenvolvimento)”, diz ela.
Outro exemplo é a raiz de maca, do Peru, que é triturada para ser transformada em um suplemento em pó. Ela é conhecida pelo alto teor de vitaminas e minerais, além de propriedades para aumento de fertilidade e energia.
Uma comunidade nos Andes aprecia tanto esta raiz que construiu uma estátua de 5 metros de altura em sua homenagem na praça da cidade.
Loyer sinaliza, no entanto, que podem surgir alguns problemas quando um alimento atinge o auge da fama, especialmente se for proveniente de um país em desenvolvimento e estiver na moda em países desenvolvidos.
Xavier Equihua é diretor-executivo da Organização Mundial do Abacate, com sede em Washington, nos EUA. Seu objetivo é impulsionar o consumo da fruta na Europa.
Segundo ele, o abacate é um alimento fácil de vender: é delicioso e nutritivo, além de ser um substituto importante para vegetarianos e veganos. As fotos de pratos com a fruta publicadas por celebridades nas redes sociais também dão um empurrãozinho nas vendas.
As pessoas na China, onde o abacate também está ganhando popularidade, podem ver “Kim Kardashian passando máscara de abacate no cabelo em sua conta no Instagram. Ou ficar sabendo que a atriz Miley Cyrus tatuou um abacate no braço”.
O reinado do kale
Se o abacate é uma celebridade no mundo das frutas, então seu equivalente no universo das verduras tem que ser o kale, também conhecido como couve-de-folhas.
Com folhagem verde escura, é considerado um alimento essencial para adultos saudáveis, responsáveis e conscientes ao redor do mundo – seja usado na salada ou batido no liquidificador como suco antioxidante.
O número de plantações de kale nos EUA dobrou entre 2007 e 2012. A cantora Beyoncé chegou a usar um moletom em um videoclipe de 2015 com a palavra “kale” estampada nele.
Mas como a couve-de-folhas entrou na moda?
Robert Muller-Moore, fabricante de camisetas em Vermont, nos EUA, disse que viu a tendência se aproximar a quilômetros de distância e vendeu camisetas com a frase “coma mais kale” para o mundo todo nos últimos 15 anos.
Ele estima ter distribuído mais de 100 mil adesivos de para-choque citando os benefícios da verdura.
Ele chegou a se envolver, inclusive, em uma disputa judicial de três anos com a Chick-fil-a, a maior cadeia de fast-food de frango frito dos EUA, cujo slogan é “coma mais frango”.
“Isso chamou muita atenção para o kale”, diz ele.
Assim como o abacate, a couve-de-folhas apresenta benefícios reais para a saúde, por isso seu status de celebridade não deve ser reduzido à mera propaganda feita por celebridades.
Mas é importante manter um certo grau de ceticismo e saber que nenhum alimento é uma solução milagrosa para a saúde perfeita, independentemente de quão popular ou nutritivo ele seja.
Especialistas dizem que uma dieta variada de frutas, legumes e verduras é mais rica em nutrientes do que consumir sempre o mesmo tipo de alimento. Por exemplo, misturar alface, espinafre e agrião pode ser mais saudável do que comer só kale.
Infelizmente, parece que é mais fácil colocar apenas uma verdura ou legume no pedestal, em vez de tentar tornar todo um grupo de alimentos mais atrativo.
Esse é o desafio que Anna Taylor, que trabalha no instituto de pesquisa britânico The Food Foundation, está enfrentando.
Recentemente, ela ajudou a criar o Veg Power, uma campanha publicitária para televisão e cinema que mais parece um trailer de filme de super-heróis – o objetivo é mudar a atitude das crianças em relação aos legumes e às verduras.